Guarda-roupa de mãe

Guarda-roupa de mãe

Eu demorei anos para construir o meu “guarda-roupa de mãe”. Eu me sentia ridícula com as minhas roupas de antes. As calças jeans justas apertavam a minha nova barriga. As blusas sociais que eu usava para trabalhar na redação me faziam transpirar demais. Os sapatos eram desconfortáveis. Parecia que nada combinava com a minha nova vida de mãe. Com o meu novo corpo.

Hoje, quase dez anos depois da minha primeira gestação, entendo que é uma questão muito mais profunda do que as mudanças de manequim.

É olhar-se no espelho e tentar descobrir quem é aquela mulher que renasceu, agora mãe. É um processo longo, que pode durar anos. E tudo se resume a um único sentimento: o medo. Medo de não emagrecer. De não encontrar uma nova identidade. De ser sensual demais. Ou de menos.

A sociedade faz às mães uma imposição de como elas devem se vestir. Se comportar. A mãe que usa vestido curto é julgada como “vagabunda”. A com roupas largas e casuais é vista como desleixada. Nossa pele à mostra incomoda. Mas o contrário também. O pior é que somos as primeiras a julgar as outras mães. Com os olhos e as palavras.

Será que a gente não perde tempo demais com essa estratégia patriarcal de nos manter em constante insatisfação? 

Pois para mim essa cobrança de imagem compulsória é uma forma de nos querer alienadas. Preocupadas em gastar dinheiro no shopping para ter um visual harmônico.

E se preenchermos nossos vazios existenciais com autoestima? 

Sim, as roupas são muito mais do que moda. São uma forma de expressão da personalidade. Da criatividade. Do estado de humor. E elas devem ser nossas aliadas e não nossas tiranas.

 

 

Crueldade em dose dupla

Desde que passei a me preocupar com sustentabilidade, percebi também outro ponto: a indústria da moda é cruel não só com as mulheres, mas com o meio ambiente.

O algodão das roupas vem de plantações cheias de agrotóxicos, as peças coloridas e estampadas devolvem quantidades absurdas de química para a água que é usada no processo, o couro de sapatos e bolsas é curtido com substâncias que infertilizam os solos.

E mais: as grandes confecções terceirizam tanto a produção que é impossível saber como são as condições de trabalho das pessoas, algumas análogas à escravidão.

Foi o que eu aprendi com o livro “Substitua consumo por autoestima”,   um guia rápido e fácil sobre consumo consciente. As autoras são consultoras de estilo e dão dicas de como, onde e quando comprar as peças do guarda-roupa.

Mas destacam: o melhor mesmo é aproveitar o que a gente já tem com sobreposições, novas combinações de peças, cores e acessórios. E quando realmente precisar de algo novo, comprar naquela loja pequena do bairro ou daquela amiga estilista talentosa! É uma forma de ajudar a economia e quem precisa de verdade.

No Brasil, ainda é muito difícil rastrear as cadeias de produção das grandes redes. Então, o melhor mesmo é evitar ir às compras.

As autoras lembram:

“Compra não gera conforto. Essa história de shopping-terapia é a maior furada. Cuidar dos nossos vazios com carinho e atenção é o que conforta pra valer. Dá trabalho e pode ser doído, a gente sabe – mas vale mais a pena do que uma comprinha vazia de significado.”  

Desde que passei a me amar do jeito que eu sou, minhas compras por impulso diminuíram. Meu guarda-roupa ganhou tons diferentes e coloridos. E finalmente pude descobrir em quem me transformei.

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