30 jun Reflexões sobre a cozinha
Minha mãe, a dona Cida, era a filha mais velha de uma família de sete irmãos, do interior de São Paulo. Ela contava que aprendeu a cozinhar na casa da madrinha, uma mulher de hábitos “refinados”. Eu achava engraçado quando a minha mãe falava isso! E eu ali, menina, no pé do fogão. Observava enquanto ela sovava pães, batia bolos e testava novas receitas. Algumas bem refinadas mesmo! Eu adorava olhar os livros dela e sugerir alguns pratos. A dona Cida era uma daquelas cozinheiras de “mão cheia”.
Por causa da minha mãe, eu sempre tive uma relação de amor com a cozinha. Eu adoro comer! E comecei a me arriscar no fogão aos oito anos de idade. Mas na correria da vida adulta, me afastei da culinária. Passei a me alimentar muito mal. Meu intestino travou, o humor e o sono ficaram bagunçados.
Eu também me sentia incomodada com aquele ambiente tão familiar para as mulheres da minha família e tão estranho para os homens. Eles só apareciam pra comer. E aquilo me incomodava. Minha reaproximação com a cozinha só voltou nos últimos anos, quando meus filhos nasceram.
Eu confesso que estava exausta. Na introdução alimentar do meu filho mais velho, dei sim a famosa papinha Nestlé! Mas quando eu e meu parceiro vimos que a situação estava muito ruim, decidimos nos unir. Passamos a montar nós dois um esquema para cozinhar papinhas caseiras e congelar para a semana toda. Nós éramos da turma da junk food. E voltamos para a cozinha por causa das crianças.
Como jornalista, na mesma época, comecei por coincidência a escrever sobre alimentação no meu trabalho. De tanto pesquisar, me apaixonei pelo assunto. E percebi que a cozinha é um espaço de poder e autonomia. Ela nos liberta do que o capitalismo nos empurra goela abaixo!
Com a industrialização e a entrada das mulheres no mercado de trabalho, nossas geladeiras foram invadidas pelos produtos ultraprocessados. Eles são práticos, mas cheios de substâncias químicas que causam obesidade, diabetes, hipertensão e outras doenças.
Eu sei que cansa, mas precisamos voltar a cozinhar. Só que desta vez é hora de mostrar de quem é a responsabilidade pela cozinha: da família toda. Homens, mulheres e crianças. Todos devem se envolver com as tarefas que cercam a cozinha: escolher os alimentos, pensar no preparo, cozinhar, lavar a louça.
Em 2018, comecei meu processo de reeducação alimentar. Tive a ajuda de duas nutricionistas maravilhosas que me guiaram pelo mundo da nutrição funcional por um ano. Emagreci, melhorei a minha saúde. E criei no Instagram a minha hashtag #naturebicesdalu onde compartilho minhas descobertas no mundo da gastronomia e da vida saudável.
Em 2019, fiz um curso de culinária natural. No curso, eu entendi que adoro esse tema, adoro ter ideias de novos pratos, cardápios e ingredientes. Meu negócio é entender a origem dos alimentos, as funções de cada um no nosso organismo e como deixar o mundo vegetal mais saboroso.
Eu não acredito em dietas restritivas, mas em reeducação alimentar. Para a rotina, eu invisto na simplicidade. Receitas com muitos processos me irritam. Um bom ingrediente, um bom tempero e o jantar tá pronto!
Na minha casa, nos revezamos nas tarefas da cozinha. Meu marido assumiu as panelas em algumas fases. Ele tem um tempero maravilhoso! Aprendi muito com ele. E nós dois aprendemos juntos assistindo programas de culinária na TV, provando novos pratos e trocando ideias.
E cozinhar é isso. É partilha. É convívio diário. Se estivermos na cozinha por pressão social ou obrigação, tudo fica mais difícil. O prazer desaparece. Hoje, eu posso preparar o alimento da minha família. Com calma, amor e uma dose extra de temperos naturais. Eu sei do enorme privilégio de ter tempo para cozinhar e dividir esses momentos com as pessoas que amo. Só tenho a agradecer e torcer para que mais famílias encontrem na cozinha um refúgio nesses tempos tão difíceis. E é como a musa Rita Lobo disse uma vez: não existe alimentação saudável sem pia suja. Mas vale a pena!
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